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Assim que Lençóis Paulista, àquela época chamada “Lençóes”, foi elevada a “villa” pela Lei Provincial nº 90 de 25 de abril de 1865, já se iniciaram os pedidos na Assembléia Provincial (antigo nome da ALESP) para que fossem feitas eleições para vereadores por aqui, já que as povoações que se tornavam “villa” tinham o direito de compor suas próprias Câmaras Municipais e, consequentemente, gerir a cidade.
A primeira Câmara seria composta por um Presidente, um Vice-Presidente e outros cinco vereadores, totalizando 7 cadeiras. Suas funções eram uma junção das obrigações que têm hoje os três poderes que chamamos de Executivo, Legislativo e Judiciário.
Portanto, tudo o que diz respeito à administração pública era obrigação dos vereadores e funcionários da Câmara Municipal. Elegendo juízes que resolviam os conflitos da cidade, coletando impostos e empregando fiscais, os primeiros vereadores nomearam as primeiras ruas, construíram as primeiras pontes e fizeram as primeiras obras em Lençóis Paulista.
As primeiras eleições ficaram a cargo da Câmara de Botucatu, que até pouco tempo era a sede de Lençóis, e ocorreram tranquilamente, como noticiou o jornal Correio Paulistano:
Divulgação do resultado das primeiras eleições para vereadores em Lençóis, no dia 30 de abril de 1866.
Fonte: Correio Paulistano / Biblioteca Nacional
O mandato dos primeiros vereadores, compreendido entre 1866 e 1869, foi marcado por intensas atividades focadas na administração e desenvolvimento da jovem cidade. As deliberações abrangeram principalmente obras públicas, com foco na manutenção e construção de estradas, construção de pontes e bueiros e a criação de impostos municipais.
Os vereadores também estruturaram o primeiro Código de Posturas, que seria como uma junção das atuais Leis Municipais com o Regimento Interno da Câmara. A implementação de uma força policial da cidade também ficou a cargo deles, que efetivaram a instalação da cadeia municipal em 1868, onde hoje se encontra a Praça Paulo Freire. Houve também atenção à saúde pública, com registros de surtos de varíola e aprovação de despesas para enterros.
Este modelo de Câmara seria seguido até 1889, quando a Proclamação da República dissolveu as câmaras municipais e passou as responsabilidades dela a um Conselho de Intendência, cujo presidente, como Intendente principal, se transformaria na figura do Prefeito que conhecemos hoje.
Foram seis legislaturas e mais de 60 vereadores nessa primeira fase da Câmara, que só voltaria a funcionar em 1892 (com a Constituição de 1891 e a reorganização do Estado de São Paulo), compartilhando o poder com o Conselho de Intendência e o judiciário.
Os primeiros vereadores eleitos para a Câmara Municipal da Villa de Lençóes, que deu início aos seus trabalhos em 12 de julho de 1866, foram os seguintes:
Os vereadores Theotonio Roiz de Lara Campos e Candido Lino Xavier de Castro se licenciaram no dia 19 de dezembro daquele ano, sendo substituídos pelos suplentes Joaquim Rodrigues de Camargo e Custódio José Vieira.
Eles se encontravam quando havia necessidade na “Casa da Câmara”, em sessões não numeradas às nove ou dez da manhã, que na maioria das vezes tratavam apenas de um ou dois assuntos.
Em uma meticulosa pesquisa nos jornais da época e em registros civis e religiosos de Lençóis Paulista, é possível encontrar informações preciosas acerca da vida e das famílias dos nossos primeiros vereadores.
Eles eram homens importantes na sociedade da época, e faziam parte, em sua maioria, da elite agrária dona de terras na região. Praticamente todos também fizeram parte da Guarda Nacional, instituição militar criada em 1831 que substituiu as milícias e ordenanças coloniais. Eram os famosos coronéis.
Como na época não existia nada como os concursos públicos de hoje em dia, os funcionários da Câmara eram indicados por eles, o que na prática garantia que as políticas beneficiassem a si próprios.
Alguns dos vereadores, no entanto, não têm muitos registros históricos, seja pelo tempo e a raridade das informações ou pelos nomes, que às vezes eram muito comuns na época, o que dificulta saber se os registros tratam mesmo desses indivíduos.
Abaixo deixamos as informações que conseguimos encontrar sobre os nossos primeiros vereadores. Se você tiver informações sobre eles que não constem na postagem, não hesite em nos contatar!
Nascido entre 1831 e 1832 na cidade de Lorena, Oliveira, como assinava as atas, era agricultor (dono de escravos), Capitão da Guarda Nacional, e atuou também como Inspetor da instrução pública (educação) e agente postal dos Correios em Lençóis Paulista.
Foi um dos membros da comissão encarregada pelas obras da Igreja Matriz de Lençóis, que na época não passava de uma pequena capela de madeira, e “comissário vacinador”, agente responsável pela implementação e fiscalização da vacinação obrigatória contra a varíola, uma doença grave que assolava o país no século XIX.
Ele era casado com Deolinda Antonia de Oliveira e não há registros que indiquem que o casal tenha tido filhos, o que é improvável.
Rodrigues de Almeida era fazendeiro e Coronel da Guarda Nacional, além de também ter atuado como Delegado de polícia, agente dos Correios e “Juiz de Órfãos e Ausentes”, magistrado responsável por proteger os interesses de órfãos, viúvas e pessoas ausentes (como herdeiros que viviam no exterior).
Ele também fez parte da comissão encarregada das obras da Igreja Matriz e foi abitrador da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Mudou-se no decorrer da vida para a cidade de Agudos, onde foi Presidente do Diretório Político do Partido Republicano e, eventualmente, Presidente da Câmara da cidade. Pode ter vivido por um período em Limeira.
Seus pais eram Manoel Rodrigues de Almeida e Gertrudes Maria Marques. Era casado com Cândida De Almeida Cardia, da poderosa família Cardia, com quem teve o filho Benedicto Ottoni de Almeida Cardia (que se tornaria o primeiro prefeito de Agudos). Teve como netos Eliseu Machado Cardia e Terezinha do Carmo Cardia.
Viveu em Lençóis, Laranjal e Tietê (onde foi Presidente da Câmara). Por lá, também foi membro da comissão para dirigir as obras da cadeia e, postumamente foi homenageado no nome da seção masculina e oftalmológica da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Faleceu em 29 de setembro de 1908 em São Paulo. Seus restos mortais foram sepultados no Cemitério da Venerável Ordem Terceira do Carmo. Este é o único dos primeiros vereadores cuja última morada é conhecida.
Foi Capitão da Guarda Naciona, e teve como esposa Helena Ribeiro de Castro, com quem teve os filhos Booz Pereira de Castro, Manoel Pereira de Castro Simões, Simão Pereira de Castro, Sansão Pereira de Castro, Anna Pereira, Severina Pereira, Analia Pereira Murbach, Noemia Pereira de Oliveira e Ruth Pereira de Mattos. Foi avô de Nocin Pereira Oliveira.
Residiu nas cidades de Piracicaba e Araraquara. Em Lençóis, foi Capitão da Guarda Nacional e casou-se com Maria de Arruda Penteado. Teve os filhos José Correa de Moraes, Estevão Correa de Moraes, Belmiro Correa, Fortunato Correa de Moraes de Arruda Penteado, Octavio de Moraes Bueno, Marcolino Correa de Moraes, Ernesto Correa de Moraes, Maria Correa de Moraes Liborio e Elisa Moraes Lima. Teve os netos Luiz Gonzaga e Vilson Correa de Moraes.
Foi Tenente quartel-mestre da Guarda Nacional em Lençóis, além de servir como juiz de paz.
Há poucas informações sobre Xavier de Castro. Talvez tenha se mudado para Espírito Santo da Boa Vista, atual Angatuba.
Foi Alferes da Guarda Nacional em Lençóis, e teve como esposa Joana Silveira de Almeida. Foi pai de José Rodrigues de Camargo, Benedicto da Silveira Camargo, Gertrudes da Silveira Camargo e Laurinda Rodrigues de Camargo.
Foi Alferes da Guarda Nacional e fez parte da comissão para dirigir as obras da ponte sobre o ribeirão do Turvo, na estrada entre Lençóis e Espírito Santo do Turvo. É provável que tenha se mudado para Batatais.
A formação da primeira Câmara pinta um retrato de uma pequena comunidade começando a se organizar, lidando com o crescimento, tentando arrecadar fundos para resolver necessidades básicas e criando regras de convivência. Esses vereadores são parte da microhistória da administração pública, mostrando o que era necessário para gerir uma pequena cidade agrária.
“Lençóes” já teve um território vastíssimo, compreendendo cidades que hoje a superaram no tamanho e na importância, como é o caso de Bauru, e foi sobre todo esse espaço que reinavam os figurões da elite agrária que deram forma e direção para o centro urbano que viria a se tornar Lençóis Paulista.
Agradecemos profundamente ao Espaço Cultural “Cidade do Livro”, em nome de Silviane Sanches, por, através da Biblioteca Digital do Acervo Histórico Municipal, disponibilizar as primeiras atas da Câmara e também as atas de juramento do período, que foram imprescindíveis para esse conteúdo.
Outro arquivo digital sem o qual essa pesquisa seria impossível foi o da Biblioteca Nacional, que disponibiliza periódicos em sua hemeroteca dos primórdios do século XIX, e que registraram alguns passos dos vereadores aqui mencionados.
Importante também foi o website FamilySearch, que, em parceria com o Governo Federal e o Arquivo Nacional, disponibiliza registros civis e religiosos de todo o Brasil e que também deu dicas sobre as famílias dos nossos protagonistas.
Pela natureza das informações, que são muito antigas e, às vezes, constam apenas em caligrafia da época, é possível que alguns nomes e sobrenomes estejam errados ou com a grafia diferente da original. Há casos em que o nome da pessoa foi escrita de todas as maneiras possíveis. Nesses casos, demos preferência à grafia que aparece na assinatura da pessoa (caso essa não seja muito diferente da grande maioria dos achados), como é o caso de “Correa de Moraes”.
Publicado em: 08 de maio de 2025
Publicado por: Comunicação
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Categoria: História da Câmara